sábado, 16 de novembro de 2019

O IRLANDÊS (2019) "The Irishman" de "Martin Scorcese"



Martin Scorsese, um inegável mestre da sétima arte realiza um clássico instantâneo dando um passo adiante na concepção de filme sobre a máfia do século passado.

Scorsese tem uma filmografia espetacular que inclui clássicos como Táxi Driver (1976), Touro Indomável (1980) e Os Bons Companheiros (1990), seu diferencial em meio aos outros realizadores é o seu poder de permanecer relevante em suas obras mesmo com o passar das décadas, inclusive também em histórias atuais e aclamadas como Os Infiltrados (2006) e O Lobo de Wall Street (2013). Não é qualquer um que tem esse poder de domínio em sua arte, atravessando gerações, não satisfeito ele apresenta novos e interessantes caminhos inclusive para a indústria cinematográfica. O Irlandês é um filme que faz parte de sua parceria com a gigante plataforma de streaming Netflix, que se viu obrigada a lançar, mesmo que discretamente, a produção nos cinemas e novamente abrir a mente dos mais conservadores de que cinema, desde que bem feito, pode ser realizado em qualquer lugar. A guerra entre Netflix e os exibidores tá longe de acabar e ganha força com a Disney e a Warner transitando nessa onda, lançando produção diretamente em seu streaming. O filme já foi exibido em festivais durante esse ano sendo aclamado por onde passa e certamente estará entre os escolhidos do próximo Oscar, encerrando ou inflamando o debate sobre como o streaming poderia influenciar a arte de fazer cinema. Deixa de ser uma utopia e vira uma realidade que o cinema já flerta com as novas tendências do mercado, afinal, Roma (2018) também da Netflix, era um filme digno da estatueta principal de Melhor Filme da premiação mais importante do cinema na cerimônia desse ano, inclusive favorito mesmo a contra gosto e foi alvo da falta de visibilidade dos votantes do Oscar, que escolheram o esquecível Green Book, se tornando mais um erro histórico do Oscar. Além de todo esse debate sobre "Cinema versus Streaming", Martin Scorcese recentemente entrou em uma polêmica global envolvendo filmes de heróis com foco nas produções da Marvel, onde ele disse em entrevista que essas produções não são cinema, uma clara crítica a linha de produção cultural praticada atualmente, seja pela Disney com os filmes da Marvel ou também da detentora de O Irlandês, a Netflix com suas produções sem uma curadoria. Outro debate necessário que prova o quanto o diretor ainda se propõe aos riscos da modernidade. Quanto ao filme, ele é baseado no livro de memórias do investigador e advogado Charles Brandt, "I Heard You Paint Houses" de 2004, no qual relata o caso de Frank “The Irishman” Sheeran, um sindicalista com ligações ao crime organizado que, pouco antes de falecer em 2003, confessou ter assassinado o líder sindical Jimmy Hoffa, desaparecido em 1975. Sheeran, Robert De Niro sob uma camada de maquiagem, está preso em um lar de idosos, alienado de sua família e contando suas histórias de glórias da máfia a um público invisível. Sua narração se volta ao elenco digitalmente envelhecido, Joe Pesci como o chefe do crime de Philly Russell Bufalino, Ray Romano como seu primo advogado da máfia Bill Bufalino, Harvey Keitel como Angelo Bruno e Al Pacino como o futuro amigo e alvo de Sheeran, Presidente da União, Jimmy Hoffa. A história entra em um segundo quadro, quando Russell e Sheeran vão para um casamento em Detroit. A data é 30 de julho de 1975, e esse é o último dia em que Hoffa foi visto vivo, em Bloomfield Township, em uma reunião com a multidão. Dentro desse quadro, Sheeran relata como ele passou de caminhoneiro para executor da máfia, para guarda-costas de Hoffa e, finalmente, o carrasco do chefe do sindicato. Com orçamento de quase 160 milhões, é um dos filmes mais caros da carreira de Scorcese, a produção é excepcional e pulsa aos olhos em todos os aspectos, em textura, maquiagem, figurino e ambientação, que faz jus a tal investimento. O ponto chave do filme está na experiência pessoal de Sheeran como intermediário nos complicados negócios de Hoffa com a máfia. Pacino aparentemente tenta criar um Hoffa que não cruza com outras vertentes de sua carreira ao interpretar mafiosos no cinema. De Niro expõe Sheeran como um trabalhador rígido, cujo o trabalho é matar pessoas. O irlandês é um resumo das obsessões de Scorsese sobre relações humanas e políticas, se encaixando na tradição cinematográfica da máfia americana de que essas são figuras que de alguma forma trágica são os "bons" homens de família, algo que no Brasil seria a "família tradicional brasileira", discurso vendido pela atual política do país que se esconde por trás de uma singela máfia de laranjas. O filme só peca na dificuldade do diretor em trabalhar personagens femininos ou ele simplesmente não vê a necessidade de mulheres na trama, faz falta, Anna Paquin nem tem chance de brilhar. Scorsese romantiza mafiosos como imperfeitos, mas ainda glamourosos, desfeitos por sua própria arrogância, na espera que o público sinta a angústia de Sheeran quando ele é levado para matar seu suposto amigo e também na solidão da sua sobrevivência. É a representação clara do dito popular, o crime não compensa. OBRA PRIMA.


O filme está em exibição especial em cinemas selecionados, não está em circuito. O filme estará disponível no streaming da Netflix em 27 de Novembro.


Hype: EXCELENTE - Nota: 10

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