sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

TITANE (2021) de "Julia Ducournau"

 


VISCERAL OU DOENTIO? 🚘 Em Titane, a cineasta Julia Ducournau (Raw) apresenta a glória visceral, evitando a representação de poucas funções corporais, enquanto explora a identidade de gênero e a necessidade esmagadora de afeto em um mundo onde fazer a escolha errada sobre qualquer um deles pode ser fatal. Gratuito e com imagens perturbadoras, mas também projetado para distorcer as normas tradicionais, de tal forma que o filme se torne uma experiência para o público, somos desafiados a desviar o olhar e buscar o entendimento da interessante narrativa. Nossa heroína é Alexia (Agathe Roussel), quando criança ela incitou seu pai em um acidente automobilístico que a deixou com uma placa de titânio em sua cabeça. Já adulta ela mostra a cicatriz, enrolada como o lobo pré-frontal de seu cérebro sem por menores, ela se tornou uma serial killer. Enquanto sua família é confortavelmente de classe média alta, ela se rebela realizando danças exóticas com carros clássicos americanos na frente de uma multidão adoradora que não consegue entender as profundezas de sua psique danificada. Em meio a tudo isso, Alexia demonstra um tédio francês adequado, ficando irritada em vez de ansiosa quando seu último assassinato se torna complicado. Sua afeição se limita aos carros, desde o veículo em que foi ferida, até um Cadillac que a seduz depois de um assassinato. Isso muda quando seus crimes ameaçam alcançá-la, e ela foge, apenas para se ver adotada por Vincent (Vincent Lindon), um chefe dos bombeiros envelhecido que está convencido de que ela é o filho sequestrado dele 10 anos antes. Para um filme que arma a nudez impunemente, esta é uma obra distintamente não erótica. O corpo de Alexia, tão potente em conquistar os outros no início, rapidamente se transforma em seu inimigo. Ducournau não nos poupa de nada, Titane apresenta o carnal como um exercício intelectual, vicioso e incessante em externalizar a violência cultural sobre as normas de gênero em uma sátira estilizada que o deixará devidamente desconcertado e surpreendido. 
 
🏆 Vencedor da Palma de Ouro no último Festival de Cannes 👏
 
👀 Disponível no Mubi  - 🏅 Hype: ÓTIMO



quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

BELLE (2021) de "Mamoru Hosoda"

 


FÁBULA PÓS MODERNA SOBRE CURA - Belle é um filme nipo-francês realizado e escrito por Mamoru Hosoda (indicado ao Oscar de melhor animação por "Mirai", em 2019) e produzido pelo Studio Chizu, com base no conto de fadas francês "La Belle et la Bête" da autora Jeanne-Marie Leprince de Beaumont. A animação é um mergulho em uma realidade virtual vibrante chamada "U" e como Suzu vive os reflexos de uma vida apática no mundo real e em "U" consegue se realizar como Belle, uma cantora conhecida e adorada por milhões de usuários da plataforma. A emocionante narrativa entra em paralelo com à história de "A Bela e a Fera" em uma releitura para o universo de anime. Belle representa bem o típico clichê do jovem geralmente retratado na cultura pop japonesa ou coreana, cheio de sentimentalismo, desajustado, cercada por pressões, traumas e uma família incomunicável ou não presente. O que poderia ser banal se torna seu grande trunfo, é nesse universo virtual que se desenrola o verdadeiro conto de fadas, onde diversas questões se confrontam, amor e ódio, desejo e agressividade, vida e morte, essas forças que habitam no ser humano e estão presentes no cotidiano e nem sempre ultrapassam a barreira entre o real e o virtual. Essa bipolaridade é o centro dos conflitos psíquicos e sociais que vivemos atualmente, os jovens se escondem e se ocupam em redes sociais fúteis onde conseguem enorme visibilidade e viram "celebridades" e se esquecem de viver o real. Mamoru Hosoda entende o mundo caótico da internet e infiltra a narrativa com um verdadeiro turbilhão de telas, lives, sites de notícias e balões de comentários. Nesse mundo de simulacros, as histórias reais são engolidas pelo excesso de informação, em que a violência e o entretenimento recebem os mesmos patrocinadores. Esse dualismo se torna uma grande reflexão e faz-se presente questionamentos sobre as forças da vida e como a realidade virtual pode se tornar aparato para confundir, desunir e separar. Belle é mais que um deleite visual, é sobre a vida moderna.
 
👀 CINEMA - 🏅 Hype: ÓTIMO 👌 




quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

AURORA - The Gods We Can Touch (2022)

 


OS DEUSES QUE PODEMOS TOCAR - O enigma pop norueguês de Aurora retorna em seu terceiro álbum "The Gods We Can Touch" onde 15 canções usam mitos clássicos para ilustrar os problemas modernos sobre o mundo. A artista recentemente declarou à publicação Gay Times que o single Cure For Me lançado em julho de 2021, foi escrito após ela refletir sobre os horrores das terapias de conversão, onde profissionais prometem “curar” a homossexualidade. “Eu estava na Austrália e prestes a ir para o Brasil, onde tenho muitos fãs gays. Sentei-me em algum lugar pensando no mundo e no amor. Ela disse ainda que o Brasil passa por um “difícil clima político”, acrescentando que o presidente do Brasil é o “pior humano do mundo”. O single sombrio e melancólico 'Cure For Me' serve como o cerne do álbum - não apenas soltando uma bomba de libertação em seu refrão viciante, mas também servindo de inspiração para a temática da divindade grega. Um fato curioso sobre o álbum é que em cada uma das músicas faz referência a deuses diferentes da mitologia grega, o que cria o fio condutor da obra - caminhando e dialogando com essas narrativas. Por exemplo, em “On Exist For Love” é Afrodite, “Heathens” está ligado à Perséfone, “This Could Be A Dream” com Morfeu e “A Dangerous Thing” sobre Peitho. Essas músicas monumentais são totalmente fascinantes do início ao fim, com momentos sinceros e de profunda construção. Aurora transmite mensagens positivas através da arte contemporânea ousada e sonoramente irresistível. The Gods We Can Touch  é uma produção provocativa que explora as faces dos nossos sentimentos, como a vergonha, o desejo e a mortalidade presente em nossas vidas que paralelamente estão em diálogo com esses personagens da mitologia grega. Energias vibrantes e catárticas se exibem de forma maximalista neste terceiro álbum de estúdio, provando mais uma vez que Aurora assim como outras estrelas da música pop atual possuem força em sua voz embalada por sensações contundentes com algo realmente importante a dizer a essa geração. 
 
🎧 Escute: CURE FOR ME e GIVING IN TO THE LOVE.
 
👌 Hype: ÓTIMO 
 

 


terça-feira, 25 de janeiro de 2022

SPENCER (2021) de "Pablo Larraín"

 


O TERROR DA REALEZA - Quem espera uma biografia tradicional sobre a Princesa Diana em Spencer se depara com uma fábula que é quase um filme de terror, sobre uma princesa que vive uma tragédia pessoal e intima longe do rótulo Princesa do Povo (como o ex-primeiro-ministro Tony Blair a batizou). Sua dor é ouvida de perto com a respiração pesada, olhar vazio e a solidão da redoma dos muros do palácio real, que na verdade encurralam o seu verdadeiro eu: Spencer. O diretor, Pablo Larraín recria o seguinte cenário: ano de 1991 durante as festividades natalinas. A família real reúne-se na propriedade de Sandringam, em Norfolk. E passam-se aqueles que seriam os últimos dias do casamento de Diana e Charles. Esta é a hipotética história de uma mulher acorrentada por convenções e formalismos, adormecida em nostalgia e apressada numa busca incessante pelo autoconhecimento. Na abertura do filme, uma perdiz fica ingenuamente no meio da estrada antes de ser prontamente esmagada por um caminhão. Pronto, tal metáfora já implica em afastar Spencer de uma biografia tola. A atriz Kristen Stewart (Maravilhosa no papel!) vive uma princesa em crise; sofrendo de um distúrbio alimentar, perseguida pela mídia e com assustadoras alucinações. Embora o filme mostre a família real ela aparece como uma presença incidental. Diana está muitas vezes sozinha. Seu marido, Charles, Príncipe de Gales (Jack Farthing), oferece fiapos periódicos de atenção e desânimo com ela. Seus filhos não entendem suas angústias. Sua única confidente é Maggie (Sally Hawkins) que pouco sustenta sua inquietude. O simbolismo bombástico do filme dispensa o decoro, as intenções problemáticas de Larraín vêm à tona, dispensando de representar respeitosamente a realeza. As ocasionais explosões de exuberância e transgressões tolas do filme estão de acordo com a desobediência de Diana. Um presente de Natal comprado em um posto de gasolina ou um passeio solitário à meia-noite são subversivos suficientes para quebrar qualquer glamour de uma vida de princesa e mostrar que a arte pode ser encontrada sob qualquer lente ou olhar. Uma OBRA PRIMA! 👏👏
 
👀 CINEMA - 🏅 Hype: ÓTIMO 👌



 


quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

BENEDETTA (2021) de "Paul Verhoeven"

 


PROFANO E AUTOCONFLITANTE! 🙏 O drama/suspense erótico de Paul Verhoeven sobre o relacionamento entre duas freiras lésbicas em um convento italiano do século XVII ( Esse caso se tornou um dos primeiros casos documentados de lesbianismo da civilização ocidental moderna depois que um escrivão da paróquia escreveu sobre isso em seu diário) troca o típico romance contido em filmes de época que tratam o amor entre duas mulheres por um enumerado de cenas provocadoras e até certo ponto com interessante reflexão e fetiche de uma sociedade fascista pela dor e pelo fanatismo. Encarnada por Virginie Effira, Benedetta é uma crente devota no amor de Jesus que nem sempre tem certeza da melhor forma de retribuí-lo. Uma certa grandiosidade acompanhou sua fé desde que ela foi aceita no convento. A única guerra que Benedetta tem que travar é aquela contra a integridade de suas próprias crenças, mesmo que esse conflito interno se transforme em uma luta pelo poder com a "chefe" do convento, a freira L"abbesse (Charlotte Rampling, em atuação apagada). Em meio a sua estranha conexão com a religião, se envolve com a inocente e traumatizada, Bartolomea (Daphne Patakia). Há um choque instantâneo de intimidade entre essas duas belas mulheres, embora nunca se transforme em algo sentimental. Como Benedetta lida com seu sofrimento pessoal é o caminho para conhecer o seu Cristo particular, inclusive o diretor Paul Verhoeven apresenta uma das cenas mais interessantes do filme, a aparição de um Jesus "diferente" (sem mais detalhes para não estragar a experiência de quem não viu o filme ainda). O que Benedetta deve fazer com seu prazer? Verhoeven obviamente rejeita a ideia de que nossos corpos não devem ser desfrutados isso rende momentos intensos de erotismo e nudez. Com todos esses elementos e a experiência de Verhoeven em ficção científica intensificam o hype de Benedetta, porém seu argumento reforçado por um terceiro ato exagerado conflita muito com toda a estrutura apresentada. Se a história se aproxima dos relatos verídicos, é decepcionante acompanhar o excesso de culpa que carrega o seu desfecho, quase jogando tudo a perder. 

👀 CINEMA (Streaming: Telecine) - 👌 Hype: BOM




terça-feira, 11 de janeiro de 2022

EDUARDO E MÔNICA (2022) de "Renê Sampaio"


QUEM UM DIA IRÁ DIZER 🎵  A "canção-história" Eduardo e Mônica de Renato Russo do álbum "Dois" da banda Legião Urbana ganha um belo filme sobre a vida, sobre encontros, desencontros, sobre o amor e sobre Brasília. O diretor Renê Sampaio que também realizou a adaptação de Faroeste Caboclo (2013), mostra toda a força da composição atemporal de Renato Russo e transforma o filme em um romântico e dramático conto urbano. O adolescente Eduardo (Gabriel Leone) e a descolada adulta Mônica (Alice Braga) se encontram por acaso, apaixonam-se loucamente e vivem os altos e baixos de uma relacionamento na década de 80. O diferencial do filme é não se apegar a canção adaptada deixando a memória afetiva do espectador transitar enquanto rola a história. Obviamente cada trecho da música tem sua abordagem, a história se desenvolve no passo a passo como qualquer comédia romântica, as diferenças de personalidades começam  a gerar atritos que qualquer relacionamento pode ter ("A barra mais pesada que tiveram" da letra da música). Essa barra mais pesada ganha uma profundidade interessante imposta no filme, Mônica é estudante de medicina mas também é artista performática, filha de um artista plástico exilado pela ditadura militar. Eduardo não apenas "jogava futebol de botão com seu avô", mas foi criado por ele, militar da ditadura reformado (papel de Otávio Augusto). Esse conflito de ideais político soa como uma clara provocação a polaridade que vivemos atualmente. O drama sincero é de fácil apego e esconde algumas problemáticas que são detalhes que passam despercebidos, seja em incoerências no roteiro ou no excesso de didatismo. Com uma excelente reconstrução de época, Brasília está linda, vanguardista e provinciana como deve ser, a trilha de rock oitentista é deliciosa assim como as diferenças tecnológicas da época, além da ótima química dos protagonistas. Uma carinhosa e reconfortante forma de voltar no tempo e lembrar da poesia musical de Renato Russo

👀 CINEMA (Streaming: Telecine)👌 Hype: ÓTIMO 



segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

THE WEEKND - "Dawn FM" (2022)

 


ESTAÇÃO DE RÁDIO DO PURGATÓRIO - O quinto álbum de estúdio do cantor canadense The Weeknd é mais um trabalho conceitual que enriquece sua veia melódica e sua angústia existencial. O trabalho funciona como uma estação de rádio, com direito a vinhetas, interlúdios e até comerciais fictícios. Logo na primeira faixa, podemos ouvir o apresentador de um programa recebendo os ouvintes: “Você está ouvindo agora a 103.5, Dawn FM”. A voz, que pontua diversas faixas do álbum, é do comediante Jim Carrey, amigo pessoal do cantor. O trabalho tem diversas participações especiais.  Abel Tesfaye está mais seguro do que nunca como artista na linha de frente da música  pop, Dawn FM chega como o primeiro grande lançamento do ano. É uma produção grandiosa e ousada, com canções que se complementam e se alternam entre potenciais hits e baladas. A primeira metade do álbum é mais agitada. Ele segue oitentista em "How do I make you love me" e "Sacrifice", alternando em tons extremos, "Take my breath" já lançada em 2021 é a mais dançante. "A Tale by Quincy" traz Quincy Jones, para falar sobre lições de vida. "Out of time" puxa a segunda metade do álbum, mais calma. A ideia do álbum surgiu a partir de um período depressivo de The Weeknd durante a pandemia, no qual ele começou a imaginar um mundo de fantasia onde essa FM era a única trilha sonora enquanto caminhava em direção à luz no fim do túnel. Nessa vertente surge alguns versos sobre a vida após a morte que parecem estar ligadas aos assuntos atuais somado ao bloqueio causado pelas incertezas. “Você esteve no escuro por muito tempo, é hora de entrar na luz”, diz a faixa-título de abertura, e complementa (“agora que todos os planos futuros foram adiados, em breve você será curado, perdoado e revigorado, livre de todo trauma, dor, culpa e vergonha"). Então, talvez esse acontecimento signifique maturidade nascida de uma experiência amarga. O The Weeknd transita da asfixia erótica a drogar-se a se sentir ferido. Dawn FM é uma maneira fantástica de celebrar o auge da carreira do cantor com belas melodias e canções.

🎧 OUÇA: "Gasoline" e "Take my Breath"

 👌 Hype: ÓTIMO


quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

SOBRE A ETERNIDADE (2019) ou "Da Eternidade" ou "Om det oändliga" de "Roy Andersson"

 


SOBRE O INFINITO ⏳ O cineasta Roy Andersson entrega reflexões humanas do que somos e fazemos para continuar aqui em uma sátira que reflete um pedaço de cada um de nós, por inteiro. O filme tem sempre metade da tela nublada e cores opacas, sem definição dos cenários pra parecer mais importante o que acontece dentro de cada situação. A psicologia analítica de Carl Jung,  preenche algo que sempre fez parte dos questionamentos humanos sobre o inconsciente coletivo, presente nessa obra. Agradecer pela vida, lutar pra continuar aqui e não ir além do que a fantasia nos permite pra nos confortar de que não teremos mais esses sentimentos e sensações que nos proporcionam a sentir algo. O religioso e seu questionamento por perder a fé, o jovem que encontra o amor pela primeira vez, um rapaz tocando instrumento no metrô pra não lembrar da dor de saber que uma mina arrancou suas pernas, a sensação reconfortante de escutar música, jovens dançando, o início da vida com a celebração de ser criança, termodinâmica, o casal apaixonado sobrevoando a cidade em ruínas, a queda de um ditador, a indecisão e a incompreensão numa briga em local público, a chuva forte e o sacrifício do pai ajudando sua filha, feminicidio e a honra da família questionada pelo arrependimento. Esses esboços permitem ao espectador ir além do proposto pra continuar o desenvolvimento de cada história. Todas as sensações que nos mantém vivos, seja pelo amor, solidão ou crueldade, são de alguma forma elevadas ao máximo pelo diretor. O filme tem quase um desenvolvimento hermenêutico para interpretá-lo, passeando pela filosofia de Martin Heidegger, onde discursa sobre nosso existencialismo. É forte e enumerado para esboçar como vivemos cada um à sua maneira. Uma obra prima que deve ser conhecida por quem realmente ama cinema e uma das maiores injustiças do mercado de exibidores do Brasil, não  lançando o filme para o público em geral mesmo após 2 anos do lançamento na Europa! 
 
👀 Não lançado no Brasil até o momento! Exibido em festivais! 
(Lançado no país de origem em 2019) 
 
🏅 BEST OF 2021 (Menção Honrosa)




segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

ATAQUE DOS CÃES (2021) - "The Power of the Dog" de "Jane Campion"


VINGANÇA🧵 Sobre o cão que ladra e não morde e o cão que não ladra mas morde. O faroeste sútil e provocador foca nas nuances de seus personagens e nas paisagens de tirar o fôlego, a direção de Jane Campion (O Piano), deixa o expectador hipnotizado com a tensão entregue graças também ao forte elenco e sua trama arrebatadora que segura a tensão até o seu final. Campion, cuja carreira inteira tem sido sobre encontrar maneiras sutis de arrancar o que não está sendo expresso, ou que talvez não seja nem mesmo expressável, talvez seu hiato longe das câmeras, sem muita pressa e ansiedade de novos projetos é a constatação de uma cineasta atemporal. De mãos dadas com personagens que se disfarçam e se distorcem, Campion constrói questões narrativas opacas e ambíguas. As nuances entrega muitas cenas de contemplação e um conjunto cinematográfico espetacular. Grande força do filme está em seu elenco. Benedict Cumberbatch entrega uma atuação única e brilhante. Em suas mãos, o personagem transita entre protagonista e antagonista da mesma história de forma admirável, o suporte vem na atuação doce e quase discreta de Jesse Plemons, que vive seu irmão. Kirsten Dunst também faz um excelente trabalho como o alvo de tamanha fúria, e sua transformação gradual causada pelo peso constante do cunhado é tão sutil que lembra o de alguém se envenenando aos poucos. É possível visualizar sua expressão de forma acentuada conforme a história acontece. Seu filho interpretado por Kodi Smit-McPhee é quem aos poucos assume o papel mais revelador da trama. Inicialmente caçoado por causa de seu jeito frágil, considerado impróprio para o velho oeste, e consciente do sofrimento da mãe, ele é inevitavelmente atraído pelo magnetismo do novo tio. É tudo muito nervoso e pesado, ainda mais por uma aplicação excepcional da fotografia e as belas composições de Jonny Greenwood, músico da banda Radiohead. O filme é profundamente baseado em sua abordagem para os dois irmãos, suas visões mútuas e o que realmente significa ser uma figura masculina (tóxica ou não) na sociedade.

👀📺 Netflix 🏅 BEST OF 2021