domingo, 28 de junho de 2020

COM AMOR, VICTOR (2020) - "Love, Victor"


Sequência do filme de sucesso "Com amor Simon" vira série pela hulu e transborda carisma e sensibilidade com a causa LGBT+. 

     O seriado aborda a vida dos estudantes em Creekwood depois que Simon encontrou seu primeiro amor no filme e se assumiu gay. Apesar de se passar no mesmo universo do longa "Com Amor, Simon"(2018), não se trata exatamente de uma continuação mas sim de um derivado. O filme da Fox foi um dos pioneiros em romper padrões da indústria cinematográfica, onde um romance gay recebeu investimentos de um grande estúdio e ganhou lançamento em grande circuito sem se limitar a nichos. O mais importante da produção foi ganhar a simpatia "Gay Friendly" com adesão importante do público em geral que gosta de um bom romance. Após o filme de 2018 observa-se um interesse bem maior em produzir uma história gay ou representar os problemas reais de uma parcela da sociedade que geralmente não se vê com muita facilidade na cultura de massa. Com a venda da Fox para a Disney e o surgimento do Disney+, o estúdio decidiu realizar a série inspirada no filme mas optou por lançar no streaming Hulu por questões estratégicas de conteúdo. O resultado é empolgante, a humanidade e seriedade ao contar uma história gay, que não se limita ao mundo gay, também é uma aula de como os LGBT se tornaram uma comunidade que acolhe e muitas vezes se torna a opção mais segura em momentos delicados. 


  Desta vez acompanhamos Victor Salazar (Michael Cimino), ele vive sua própria jornada de auto descoberta, enfrentando desafios em casa, se adaptando a uma nova cidade e descobrindo mais sobre si mesmo e sua sexualidade enquanto tenta se encaixar na nova escola. Embora a história de Simon seja uma inspiração ao rapaz, Victor percebe que nem todos estão sendo honestos consigo mesmos e suas escolhas e vontades ficam cada vez mais complexas. A produção traz questões importantes para os jovens que estão naquela fase da autodescoberta, enfrentando seus conflitos em casa, na escola e, principalmente, os seus internos. Victor tem uma lista de barreiras e preconceitos que ele precisará quebrar antes de poder ser honesto com sua sexualidade. Na série de 10 episódios de aproximadamente 30 minutos, criaram um ambiente limpo e polido para a série, esse talvez seja o único ruído da produção, os adolescentes demonstram maturidade e realizações que fazem cada personagem se sentir vivido e inteligente. Essa utopia de pessoas e ambientes quase perfeitos é desfeita com o crescimento da temporada no sétimo episódio "What Happens in Willacooche...", o potencial da história ganha um contorno bem amarrado e os personagens se tornam mais críveis também, o elenco cresce junto em atuação. 


   Ainda que cada cenário de vida seja bastante pessoal, a série tem um texto coeso que envolve o espectador ficando cada vez mais intenso com o passar dos episódios e as nuances dos personagens mais evidentes com um tom agradável. É muito fácil se identificar com as divertidas e também dramáticas situações. Graças a histórias como a de Simon e Victor, pessoas conseguem aliviar o peso de uma sociedade que nem sempre sabe lidar com questões de pluralidade. Histórias como essas podem ter um papel educacional importante para que jovens explorem sua sexualidade com naturalidade. Com uma abordagem jovem e sincera, a conexão com o personagem acontece naturalmente, com ambições modestas e ainda assim admirável. Destaque para a trilha sonora que se encaixa muito bem com as cenas. Certamente haverá uma segunda temporada, o gancho final é sensacional. ENCANTADOR


Infelizmente, a série ainda não tem uma estreia confirmada no Brasil. No entanto, há chances dela chegar por aqui através do Amazon Prime Video que firmou parceria com o Hulu para o lançamento de algumas atrações no Brasil. O filme e a série são inspiradas no livro juvenil "Simon vs. A Agenda Homo Sapiens", best-seller da autora Becky Albertalli lançado no Brasil pela editora Intrinsica

Hype: ÓTIMO - Nota: 8,5

sexta-feira, 26 de junho de 2020

PACARRETE (2019) de "Allan Deberton"


Marcélia Cartaxo brilha com a especial personagem Pacarrete, um misto de loucura e sonho em um drama sobre a velhice e a valorização da arte.

    O filme foi uma das produções mais premiadas de 2019 no Brasil com bem sucedida carreira nos principais festivais nacionais além de importantes passagens por festivais internacionais. A produção cearense foi uma das afetadas pelo fechamento das salas de cinema devido a pandemia do Covid-19, sua estreia em circuito nacional seria dia 30 de abril e foi adiada sem previsão de lançamento. O filme entrou no festival digital de pré-estréias realizado pelo Itaú Cinemas (Espaço Itaú Play) e transmitido pelo Looke. A trama é inspirada numa história real e teve sua estreia no Festival de Cinema de Gramado, onde saiu premiado com Melhor Filme, Melhor Filme Júri Popular, Melhor Direção, Melhor Atriz, Melhor Roteiro, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Atriz Coadjuvante e Melhor Desenho Sonoro e desde então já coleciona mais vinte e seis prêmios em festivais. A estréia promissora de Deberton na direção é inspirada em uma história real de uma conterrânea do diretor e demorou 10 anos para ser realizado. Foi filmado em sua cidade-natal, Russas - CE, tentando colocar na tela todas as suas lembranças do lugar.


    Na trama, nascida e criada em Russas, Pacarrete alimentou desde criança o sonho de ser artista e viver a vida na ponta da sapatilha, mesmo sendo de uma cidade conservadora, onde mulher nasceu para casar e ter filhos. Mas é em Fortaleza que ela conseguiu estar nos centros dos palcos como bailarina clássica e se tornar professora de ballet. Com a aposentadoria, ela retorna para sua cidade natal onde pretende continuar seu trabalho artístico, mas só encontra desrespeito à sua arte: em vez de plateias de admiradores e aplausos, ela se defronta com o despeito daqueles que cruzam seu caminho - e a bailarina e professora de outrora se transforma na “louca da cidade”. A história aborda questões como a loucura, a permanência do sonho e o drama da velhice de uma bailarina clássica, que gosta de ser chamada de Pacarrete – “margarida” em francês, interpretada pela premiada atriz paraibana Marcélia Cartaxo, vencedora do Urso de Prata do Festival de Berlim em 1985, por A Hora da Estrela, dirigido por Suzana Amaral que infelizmente faleceu essa semana e lançou a atriz para o mundo. O elenco principal ainda conta com as atrizes paraibanas Zezita Matos (das novelas Velho Chico e Amor de Mãe), Soia Lira (Central do Brasil, Abril Despedaçado) e o ator baiano João Miguel (O Céu de Suely, Estômago).


    Pacarrete é um filme que tem conquistado público e crítica nos festivais com mérito próprio, ainda que o filme possua uma finesse em todo seu conjunto, o seu charme principal é o popular, com elementos cômicos muito comum da comédia nordestina que se misturam com a seriedade e o drama do tema, em como as artes são ignoradas, muitas vezes por pura falta de oportunidade e de governantes que não promovem sua valorização. Nas cidades do interior essa dificuldade é ainda maior. É muito fácil se conectar com a a personagem e seus dilemas, que muito se enquadram no reflexo do povo brasileiro, essa bailarina que queria, em vida, ser reconhecida é de uma sensibilidade grandiosa, o dominio da atuação de Marcélia Cartaxo só prova seu grande talento. O drama de Pacarrete é real, vivemos em um país que não valoriza seus talentos, não cuida e não exalta grandes conquistas que surgem no suor de muito trabalho. A resistência de persistir com cinema em um país de retrocessos e ignorância vale a pena justamente para exaltar trabalhos como esse, sobre ir atrás dos sonhos, persistir, encarar o mundo e enfrentá-lo. É um filme sobre amor à arte e amor ao próximo. LOCOMOTIVA DE SENSASÕES.


O filme está sendo exibido no festival digital de pré-estréias realizado pelo Itaú Cinemas (Espaço Itaú Play) e transmitido pelo Looke ao preço popular de 10 reais o aluguel. Somente hoje 26/06 e sábado 27/06. Distribuído Vitrine Filmes.


Hype: EXCELENTE - Nota: 10

quinta-feira, 25 de junho de 2020

Hype TBT - O BEIJO DA MULHER ARANHA (1985).


    Nosso TBT de hoje aproveita o mês do orgulho LGBT+ para enaltecer um clássico bastante importante para o cinema brasileiro e que ainda precisa ser descoberto por essa nova geração de cinéfilos. O  Beijo da Mulher Aranha (Kiss of the Spider Woman) é dirigido por Hector Babenco e adaptado por Leonard Schrader através de um romance homônimo escrito por Manuel Puig. A história apresenta um "filme dentro de um filme", com o personagem Luis Molina  que episodicamente contando  o enredo de um fictício filme de ficção chamado "Her Real Glory" ("A Verdadeira Glória Dela" em português), onde brilha a estrela de Sônia Braga. A produção de 1985 tem mensagens importantes e uma trama envolvente.


     A trama conta a história do prisioneiro político de esquerda Valentín Arregui (Raul Juliae Luís Molina (Willian Hurt), um gay afeminado condenado por "corrupção de menor". Os dois dividem uma cela numa prisão brasileira durante a ditadura militar. Molina relembra, na prisão, um de seus filmes favoritos, um suspense romântico de guerra que também é uma propaganda nazista. Ele tece os personagens do filme numa narrativa que traz conforto a Arregui para distraí-lo da dura realidade da prisão e da separação de sua namorada Marta, a quem ele ainda ama. Arregui permite que Molina penetre sua autodefensiva intimidade e se abre para ele. Apesar de suas discussões sobre a política por trás do filme assistido por Molina, uma improvável amizade se desenvolve entre os dois prisioneiros.


     O filme foi um desafio para ser adaptado, além do tema homossexual ter sido encarado como um obstáculo para atrair um público amplo, havia também o medo da censura devido ao contexto político da ditadura presente no longa. Babenco, uma vez radicado no Brasil, temia uma reação xenofóbica contra a produção em virtude dos atores norte-americanos nos papéis principais e ser originalmente falado em inglês.  Foi um dos primeiros filmes brasileiros a tentar um formato  internacional para atrair visibilidade. Obstáculos adicionais à produção incluíram o antagonismo de Manuel Puig em relação a Babenco; o escritor não gostava de seu filme Pixote e suspeitava que o diretor fosse um "oportunista". Contrariando todos os pesares a produção foi um sucesso. O filme estreou no Festival de Cannes de 1985, onde Willian Hurt ganhou o prêmio de Melhor interpretação masculina, ganhando também o Oscar e o BAFTA de Melhor Ator. Babenco foi indicado para a Palma de Ouro pela direção. O filme concorreu ao Oscar de Melhor Filme, perdendo para  Entre dois Amores em uma clara demonstração de homofobia por parte dos jurados da Academia, até hoje esse Oscar gera controvérsias no real mérito do vencedor. 


    A produção foi reconhecida pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) como um dos 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos, ocupando a posição de número 61 da lista. Sem dúvidas, uma obra prima de Hector Babenco e reconhecida em todo mundo.  Luís Molina permanece como um dos personagens gays mais memoráveis do cinema brasileiro e mundial, Sônia Braga ganhou relevância com beleza de diva do cinema em suas cenas, grande parte de sua popularidade nos EUA se deve ao filme que segue sendo relevante e poderoso até hoje. 


Recomendamos que seja vista a versão restaurada do filme pelo Canal Brasil, disponível para alugar em plataformas digitais como Now, Vivo Play e outras.

terça-feira, 23 de junho de 2020

7500 (2020) de "Patrick Vollrath"


Thriller é um tenso passeio por um vôo onde a única saída é o controle emocional e a sorte de sair vivo. 

     Em mais uma produção original sem grande orçamento e sem maiores pretensões, a Amazon se consolida no perfil alternativo da competição entre os filmes originais via streaming. 7500 é o tipo de filme fácil de odiar, se passa inteiramente dentro do cockpit de um avião e ainda assim consegue um potencial claustrofóbico atraente onde o expectador ficará feliz em voltar à terra firme em segurança. O suspense tem o sólido desempenho central de Joseph Gordon-Levitt, o ator andava meio sumido das telas, seu último trabalho foi em Snowden (2016), em uma volta discreta. A produção adota o cenário familiar de um avião em risco e dificulta essa equação ao não permitir o movimento do personagem principal em um desafio estratégico e interessante. A estréia do diretor Patrick Vollrath transforma o cenário do avião sequestrado em um thriller enervante em tempo real, ambientado exclusivamente dentro dos limites da sala de comando da aeronave. Vollrath filmou o filme através de uma série de longas tomadas e contou com uma abordagem improvisada e única que exigia que os atores respondessem às circunstâncias à medida que mudavam as tomadas. 



     Na trama, tudo leva a crer que seria um dia de rotina normal no trabalho de Tobias (Joseph Gordon-Levitt), um jovem co-piloto americano em um vôo de Berlim para Paris, mas logo após a decolagem, terroristas armados com facas improvisadas subitamente invadem a cabine de controle do vôo. Temporariamente ele consegue afastar a ameaça, Tobias aterrorizado entra em contato com a central de solo para planejar um pouso de emergência. Quando os seqüestradores matam um passageiro e ameaçam matar mais pessoas inocentes esse homem comum enfrenta um teste torturante de vida ou morte. 7500, o título do filme, é o código da companhia aérea para um seqüestro. Apesar do presságio ameaçador das filmagens de vigilância do aeroporto nos primeiros momentos, o filme se instala em ambiente neutro sobre os riscos, a falsa sensação de segurança é uma estratégia interessante com foco no habitual. A sensação de embarque no vôo e na história é convincente e nunca quebra a ilusão que o espectador também é um passageiro dessa viagem, onde cada detalhe do que se passa na cabine se apresenta como uma consequência ao que pode acontecer a todos os passageiros.



     A construção de tensão ainda que eficiente nunca é impressionante, caindo em armadilhas como a deficiência narrativa da trama e a falta de amplitude, sem nunca chegar a ser boçal, esse passeio cinematográfico emocionante é uma aposta comprometida em manter o suspense e a ansiedade. Sua estratégia de abordagem gradual envolve o espectador ao cenário de ambiente fechado antes de jogá-lo no centro de um conflito que não cede até os momentos finais. Essa crise acompanhada em cenas e cortes inconstantes ressalta o talento de Gordon-Levitt, que precisa calcular ações e juntar destroços emocionais em volta da nervosa virada narrativa da última meia hora do filme. A abordagem orgânica em confrontos físicos repentinos produzem resultados desajeitados ainda que realistas, usando o que existe em sua disposição e ancorado em vilões baseados em esteriótipos. 7500 mergulha na proximidade do pavor do terrorismo com a intensidade renovada e cruel de uma realidade ainda bastante ameaçadora. O resultado supera a premissa comum de personagens arquetípicos por meio de adrenalina em um trabalho de câmera hábil e pontual. MINIMALISTA.

 

O filme está disponível no Amazon Prime Video.

Hype: BOM - Nota: 6,5

segunda-feira, 22 de junho de 2020

OLHOS DE GATO (2020) - "A Whisker Away" ou "Nakitai Watashi Wa Neko Wo Kaburo" de "Tomichika Shibayama" e "Junichi Sato"



Anime tem sabor de infância e acompanha a doce ternura de uma garota que quando está triste se transforma em um gato.

    O longa animado deveria ser lançado em junho nos cinemas japoneses, porém, devido ao COVID-19, a produção foi vendida para a Netflix. Originalmente chamado de "Querendo chorar, eu finjo ser um gato" e produzido pelo emergente estúdio de anime Studio Colorido (“Penguin Highway”), a doce e romântica história nos apresenta uma estudante cuja personalidade exuberante esconde seus sentimentos particulares de abandono e falta de clareza nas prioridades humanas. A personagem principal "Muge" traz uma pequena e irritante obsessão por um garoto da escola, Hinode e sua ingênua história de amor se transforma em uma situação preocupante quando ela prefere deixar sua condição humana e se transformar em um gato para se sentir confortável. Ainda que sua personalidade imatura não seja agradável, alguns podem achar a personagem irritante, é uma mudança de ritmo importante em relação ao tipo de personagem mal amado e retraído que tendem a ancorar sagas da idade adulta sobre solidão e amor não correspondido. 


     Na trama, Miyo Sasaki, uma estudante do ensino médio, está apaixonada pelo seu colega de classe, Kento Hinode, mas ele nunca parece notar a existência da garota. Depois de descobrir uma máscara mágica que pode transformá-la num gato chamado Taro, ela finalmente consegue a atenção de Hinode. Quanto mais Miyo se transforma em Taro, mais tempo ela passa com Hinode, mas corre o risco de nunca mais poder se transformar em humana novamente se as fronteiras entre ser humano e felino forem perdidas. O que era uma fuga de seus sentimentos mal resolvidos se transforma em uma perigosa aventura de reconciliação consigo mesma. Miyo está sofrendo, morando com seu pai e sua doce namorada Kaoru desde que sua mãe desistiu da família há algum tempo, Miyo é indiferente ao carinho que ela recebe em casa e desesperada pelo carinho que ela parece não conseguir, quer ser amada incondicionalmente. As nuances da história são bem estabelecidas e o que pode parecer bobo ou insuportável ganha um desenvolvimento interessante no agregado.



     Os traços do desenho são elegantes, com uma beleza temática suficiente para agradar aos fãs de anime e também ao público em geral. O anime chega em um momento perfeito, quando muitos de nós estamos lutando para se adaptar a um novo mundo, aonde nos isolamos presencialmente das pessoas que amamos e esse vazio precisa ser preenchido por histórias que de certa forma aqueçam nosso coração. Ainda que em alguns momentos o desenho se perca em um desinteresse de ser maior e mais profundo, seu ar infantil e inocente se torna agradável e não sufoca o espectador com problemáticas que não consigam ser superadas durante sua projeção. Olhos de Gato tem seu valor principalmente na celebração da plenitude humana e de como isso é incorporarado em uma produção focada em uma geração jovem e bastante perdida em essência. Divertido em seu realismo mágico e sempre cheio de vida, é um frescor para quem deseja um bom passatempo. ENVOLVENTE.


Disponível na Netflix! Ainda não há uma dublagem em português, apenas em versão legendada.

Hype: BOM - Nota: 7,5


domingo, 21 de junho de 2020

O LAGO DO GANSO SELVAGEM (2019) - "The Wild Goose Lake" de "Diao Yinan"



Noir chinês é o cinema do espetáculo visual e arrebatador sem ser brilhante. 

   Grandes clássicos do cinema contemporâneo são lembrados não só pelas belas imagens eternizadas que os remetem, mas também pelo seu valor como argumento e construção. Esta produção chinesa foi selecionada para competir pela Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2019 rodeada de fortes expectativas, dirigida por Diao Yinan, mundialmente conhecido por despontar em 2014 no Festival de Berlim ao ganhar o prêmio de melhor diretor por "Carvão preto, Gelo fino". O Lago do Ganso Selvagem é um complemento de sua obra de 2014 e demorou quase 5 anos para ficar pronto devido ao seu primor técnico. O resultado é deslumbrante e muitas vezes hipnotizante, a melancolia dos personagens aliado a composição das cenas agrada mesmo sem uma trama dramática atraente, sua transcendência se move no substancial. A produção tem um valor considerável pela estética moderna e pela presença do cinema marginal, onde a violência se confunde com a poesia do estilo de vida complicado dos personagens.


    Na trama, Zhou Zenong (estrela de televisão Hu Ge), é o chefe de um grupo da máfia chinesa que decide fugir da guerra sangrenta entre gangues em que se envolve, em meio a uma disputa de território ele acaba em auto-defesa matando um policial e se torna um homem procurado pela polícia. Nesse meio tempo ele encontra uma mulher, Liu Aiai (Gwei Lun-mei), que foi contratada para levar Zhou aonde ele precisa ir para escapar dessas ameaças. O filme apresenta-se como mais um exemplar do novíssimo cinema chinês, integra violência em um ambiente potencializado por cores neon e realista em atmosfera urbana, condensado a um silêncio existencialista. 


A história aparentemente simples se torna complicada fugindo de um equilíbrio narrativo necessário para a obra. O enredo busca um valor poético e se esquece de personagens importantes da trama, todo o elenco de apoio, exceto o casal principal, são reduzidos a um suporte quase vazio. Diao é capaz de dizer mais com os corpos em movimento e com cenas de ação intensas, como a cena de perseguição hiper-elíptica que corta em uma série de close-ups extremos em um tiroteio e até mesmo em perseguições com motos em plano aberto. A produção traça um caminho interessante com valor estético acima do conjunto da obra, raso em valor existencial e ainda assim com êxito em estrutura e cheio de requinte. O diretor Diao Yinan segue como uma revelação interessante do cinema oriental com estilo próprio ainda que sem uma eficiência acima da média. FRIO E CALCULISTA.


O filme está disponível no catálogo do streaming MUBI.

Hype: BOM - Nota: 7,5

quinta-feira, 18 de junho de 2020

HypeTBT - UM LOBISOMEM AMERICANO EM LONDRES (1981)

 

     O filme ficou bastante conhecido no país devido as constantes exibições nas sessões de filme do SBT, em uma época que a TV aberta ainda era um importante meio para se conhecer filmes. A produção é um marco na história dos filmes de lobisomens e gerou um grande impacto no mundo do cinema. Foi o primeiro filme a ganhar o Oscar de Melhor Maquiagem (categoria criada em 1981) e até hoje pode ser considerado o filme com a melhor cena de transformação do cinema. O trabalho da equipe de John Landis chamou a atenção e surpreendeu uma geração, logo depois Michael Jackson contratou a equipe para produzir e dirigir o clipe da canção Thriller, que se tornou um dos maiores videoclipes da história. Na trama, dois jovens turistas americanos, David Kessler (David Naughton) e Jack (Griffin Dune) estão em excursão pela Europa. Passando por uma região rural da Inglaterra os jovens embrenham-se na escuridão e não percebem que estão sendo seguidos por uma criatura terrível. Os desdobramentos da história são assustadores, seja pelo tom realista ou pela condução bastante precisa em cada ato do filme. O interessante em rever o filme em HD é o primor de sua produção que envelheceu muito bem e se tornou atemporal como outras obras primas do terror como O Exorcista, O Bebê de Rosemary e A Profecia. Outro destaque importante são as nuances dramáticas dos personagens, elas são bem executadas e funciona em contraponto com a situação sobrenatural vivida pelos personagens. NÃO DEIXE DE VER!  



Agora é a chance ideal para conferir a produção, pela primeira vez no Brasil o filme será comercializado em alta definição em BluRay e com quase 4 horas de extras. Para colecionadores como agente essa edição inédita ainda traz o capricho de uma luva especial, 3 cards, pôster e livreto de 28 páginas! Parabéns a Obras Primas do Cinema pela iniciativa!


sexta-feira, 12 de junho de 2020

ENQUANTO ESTIVERMOS JUNTOS (2020) - "I Still Believe" de "Andrew Erwin" e "Jon Erwin"


A história real da vida de Jeremy Camp, estrela da música cristã é uma jornada de amor e esperança sem grandes surpresas.
     O romance biográfico da Lionsgate foi um dos vários filmes afetados em virtude do fechamento das salas de cinema, Enquanto Estivermos Juntos foi lançado em plataformas "On Demand" nos EUA em Março desse ano com relativo sucesso. No Brasil o filme é distribuido pela Paris Filmes que pretende lança-lo nos cinemas, ainda sem qualquer previsão. A cinebiografia do cantor cristão pega carona em outros filmes que usam uma história de amor interrompida por uma enfermidade, como os sucessos A Culpa é das Estrelas (2014), Como eu era antes de Você (2016) e A Cinco Passos de Você (2019). Ainda que a produção tenha elementos para agradar quem se emociona com esse tipo de história, a direção dos irmãos religiosos Andrew Erwin Jon Erlwin (Eu Só Posso Imaginar), não apresenta o mesmo cuidado das produções citadas, o casal Jeremy Camp (K.J. Apa) e Melissa Henning (Britt Robertson) encontram dificuldades para cativar o espectador, a falta de coadjuvantes interessantes e uma narrativa apressada são alguns dos problemas. A batalha de Camp para vivenciar um amor e depois superá-lo tem o viés religioso e pudico, com certa plasticidade dos personagens, tudo é bastante calculada para que o filme agrade a esse público alvo. 



     A história gira em torno do jovem Jeremy ao deixar sua família, seu pai (Gary Sinise), sua mãe (Shania Twain) e seu irmão mais novo (Reuben Dodd) para se ingressar no Colégio Bíblico Calvary Chapel, na Califórnia. Ele espera conseguir sucesso em uma carreira musical e tudo muda de foco em sua vida quando durante em um show na faculdade ele conhece Melissa, por quem ele se apaixona a primeira vista. Ela fez uma promessa a Deus que não se distrairia neste semestre nos estudos mas Jeremy investe na conquista até conseguir uma chance. No meio desse relacionamento Melissa é diagnosticada com câncer de ovário em estágio três. Jeremy acolhe a garota e decide enfrentar a tempestade que se aproxima com o amor de sua vida, tentando manter sua fé fortalecida. A mensagem de amor e esperança ainda que válida possui uma seriedade opressiva que transforma a experiência de fé em um testemunho cansativo. 



     A obra deseja focar em como a religião foi essencial para o artista superar as dores de sua vida, principalmente quanto a Melissa e como essa história o inspirou em sua carreira músical de sucesso. É um romance clichê e feito para se emocionar, onde seus realizadores são empenhados na mensagem de Deus mas se esquecem da humanidade dos personagens, faltando raízes realistas nos mesmos. Ainda que não seja um casal marcante, Melissa e Jeremy superando os obstáculos da doença é o trecho mais envolvente da produção junto com a musicalidade. Jeremy pode não corresponder a todas as pessoas, falta diversidade e realismo, sua busca é simples e honesta, feita para agradar os cristãos em um mundo bem limpo. O seu sonho de ser músico acontece tão rápido que até parece fácil ser uma estrela da música e seu amor incondicional por Melissa é a mesma história que já conhecemos contada mais uma vez. CONVENCIONAL.



O filme não tem previsão de estréia no Brasil!

Hype: REGULAR - Nota: 5,5

segunda-feira, 8 de junho de 2020

365 DIAS (2020) - "365 DNI" de "Barbara Bialowas"



Filme erótico polonês tem cenas quentes entre os protagonistas, romantiza relação tóxica e valoriza esteriótipos.

     O filme baseado no livro de estréia da escritora Blanka Lipinska, dominou o mercado dos romances eróticos na europa, logo a história ganhou força para uma adaptação no cinema. Sem muito alarde no Brasil, 365 Dias ou no original 365 DNI é quase uma resposta européia para o sucesso de Cinquenta Tons de Cinza, só que bem mais erótico. Sem passar pelos cinemas brasileiros antes da crise do Covid-19, o filme ganhou distribuição internacional pela Netflix e logo deve se tornar um hit na plataforma. O enredo é calculado para conquistar o grande público, com belos cenários, culto ao materialismo além da incontestável beleza do casal de protagonistas em cenas sensuais. O tom novelesco da trama é recheada de polêmicas, como colocar os holofotes sobre o sadomasoquismo e induzir autoritarismo e machismo sobre uma relação. Sem sutilezas, o filme transita nas piores soluções para justificar cortes estranhos e uma história que se sustenta na curiosidade.


     Na história, Laura Bielsai (Anna Maria Sieklucka) é uma diretora de vendas de um hotel de luxo que sai de férias na Sicília com o namorado e amigos. No segundo dia da viagem, em seu aniversário de 29 anos, Laura é misteriosamente sequestrada por Massimo Torricelli (Michele Morrone), um jovem que assumiu a máfia siciliana após a morte de seu Pai. Com um passado marcado pela violência, o mafioso mantém Laura em cativeiro usando métodos eróticos, e lhe dá 365 dias, para se apaixonar por ele. Não precisa ser um gênio para adivinhar os percalços dessa relação tortuosa, mesmo tentando fugir do melodrama os conflitos tem valores exagerados e deixa tudo distante da realidade. A protagonista é interpretada por Anna Maria Sieklucka, uma atriz polonesa de 27 anos em seu primeiro grande trabalho. Já o italiano Michele Morrone de 29 anos já atuou em pequenas produções e chama a atenção pelo status de galã. Uma boa chance para ambos decolarem na carreira internacional com o empurrão da Netflix


   Sem uma sustentação inteligente, principalmente do ponto de vista cinematográfico, muitas vezes se torna risível e mal executado, ainda assim, de alguma maneira os personagens dão um certo charme para quem só deseja um momento de distração ou não tem acesso a pornografia. Sua maior problemática é não ressaltar suas qualidades, como a relação de Maximo com a máfia ou as cenas de sexo tentadoras que se perdem sem nenhuma paixão e intimidade entre os personagens. No fim das contas, transforma uma situação confusa em algo romântico, sexy e complicado de acompanhar. Os corpos nus são usados para compensar o romance desconfortável e justificar seu marketing sexista. SOFT PORN.


O filme está disponível no catálogo da Netflix.

Hype: FRACO - Nota: 4,0

segunda-feira, 1 de junho de 2020

A VASTIDÃO DA NOITE (2020) - "The Vast of Night" de "Andrew Patterson"



Criativa ficção científica da Amazon revela como uma boa condução pode fazer diferença no resultado final.

   O filme que poderia também ser uma espécie de episódio especial de Além da Imaginação ou Arquivo X, é a inventiva e promissora estréia na direção de Andrew Patterson, experiente em registros documentais  que embarca pela primeira vez em um longa metragem. O sucesso do filme em festivais como Slamdance e Toronto o levaram à aquisição pela Amazon Studios, que pretendia lançar The Vast of Night nos cinemas, o que não aconteceu devido a crise do Covid-19, a Amazon ainda conseguiu exibi-lo em Drive-Ins. O filme praticamente foi bancado pelo seu diretor que com pouco recurso, amor ao cinema e uma boa idéia levou seu projeto adiante. A despojada produção segue fiel ao espírito de mistério envolto a década de 50 no estado do Novo México, a reprodução de época impressiona, seja pelos poucos cenários, basicamente três, os objetos da época em cena e o elenco que consegue esbajar simpatia.


     Sem muito cortes, com ângulos múltiplos e uma estilosa fotografia com luzes em ambientes escuros, o filme se destaca pelas soluções criativas que levam a história em um plano sequência que se desenrola em uma única noite. Sem cair no lugar comum como ficção científica, o espectador não encontra zona de conforto em trechos delirantes na mudança de cenários ou quando é preciso acompanhar um trecho completo somente com o som do rádio em um relato sobre o mistério da trama, se torna uma experiência interessante ressaltando o diferencial do filme.


     Na trama, na noite de um importante jogo de basquete da minúscula cidade de Cayuga, Everett (Jake Horowitz), o jovem DJ da rádio local, e Fay (Sierra McCormick), a telefonista, caminham e conversam pelas ruas da cidade quase deserta. Quando barulhos estranhos começam a aparecer nas ligações telefônicas feitas por Fay, os dois jovens investigam o assunto, enquanto topam com desconhecidos que falam que há alguma coisa no céu da cidade. Um ouvinte (Bruce Davis) liga para dizer que sabe de algo. Uma outra moradora (Gail Cronauer) também parece ter informações. Tudo leva crer que algo estranho está acontecendo.


      O filme tem uma variedade de truques que dão uma textura rica e tensa em tudo apresentado. Algumas cenas são tão bem produzidas que dão um requinte ao produto final. A Vastidão da Noite não chega a ser genial, ele é impulsionado por sua originalidade dentro de um tema já bastante utilizado que ganha força no conjunto de sua estrutura, seus protagonistas conseguem um bom desenvolvimento e a falta de pretensão nos efeitos especiais fazem tudo ser muito charmoso, urgente e direto ao ponto. ATEMPORAL.


O Filme está disponível no catálogo do Amazon Prime Video.

Hype: ÓTIMO - Nota: 8,5