quinta-feira, 27 de junho de 2019

DIVINO AMOR (2019) de "Gabriel Mascaro"


Uma explosão neon semi-futurista muito bem filmado e produzindo que reflete um futuro distópico de um Brasil dominado por um movimento religioso que contamina a racionalização das pessoas. 

Essa seria uma definição direta do novo filme do diretor Gabriel Mascaro (Boi Neon), um dos diretores mais criativos e audaciosos dessa nova geração ao tratar temas como casamento, sexo, religião e fanatismo de maneira inteligente. A atriz Dira Paes se entrega ao papel de Joana, uma mulher que usa a religião como muleta em um mundo de desejos não realizados, insegurança, incertezas e caos calmo. Ela é o grande atrativo do filme assim como essa dualidade constante e sedutora de sua personagem em uma trama sem vilões ou obstáculos exteriores que não sejam a complexidade do sistema de crenças de uma sociedade longe de ser laica. Na trama Joana (Dira Paes) é uma mulher que atinge a meia-idade e ainda anseia por um bebê. Mas apesar de uma vida sexual ativa com seu marido Danilo (Julio Machado) eles ainda não conseguiram tal feito. Danilo inclusive usa um aparelho de fertilidade onde o pendura de cabeça para baixo na frente de uma lâmpada infravermelha, nu usando a engenhoca. Joana, uma mulher de fé aguçada se apega a espiritualidade para atingir tal sorte. Ela trabalha para o estado como escriturária em um cartório e, como tal, entra em contato com muitas pessoas que querem se divorciar. Ela toma para si, como uma boa mulher cristã, tentar consertar os casais em vez de registrar o fim de sua união sagrada. Ela faz isso sugerindo que eles visitem o Divino Amor, um grupo de auto-ajuda que Joana e Danilo estão envolvidos e que os ajudou em crise vivida pelo casal. Embora com tonalidade séria, é difícil não se divertir com as soluções futuristas encontradas pelo diretor para representar o Brasil do futuro, os personagens parecem possuídos pelo fanatismo religioso ao ponto de quase engolir qualquer tipo de consciência. Os trechos que se passam no grupo Divino Amor são polêmicos e causam furor no expectador assim como a igreja em drive-thru, um dos locais de culto onde Joana, com a janela abaixada do carro, reclama com o pastor (Emílio de Melo) sobre o fato de não conseguir engravidar, apesar de ter ajudado a cumprir o plano de Deus ajudando outros casais cristãos a se encontrarem novamente. Em 2027, ano que se passa a história, detectores na entrada de edifícios também são capazes de ler o DNA das pessoas para identificá-los e mostrar se estão grávidas e se o feto já foi registrado (o que indiretamente sugere que o aborto é proibido). Esses detectores e o banco de dados de DNA do governo terão um papel essencial no clímax do filme. Essas sacadas futuristas dão a entender o direcionamento das decisões conservadoras que essa parte da população apoia e seu reflexo no contexto do filme. Inicialmente o filme sugere que os rituais e crenças que vêm com a religião organizada podem ser calmantes e ajudar a estruturar a vida das pessoas, o que explica inclusive seu forte apelo nas periferias e a sua constante exaltação sobre uma vida melhor. Mas quando um tipo de evidência finalmente chega, ela provoca estragos de maneiras inesperadas, expondo fragilidades e algumas das contradições inerentes à religião. O que sugere que a teoria e a prática não estão alinhadas. Em geral, é uma obra que nunca precisa explicar como funciona sua logística, seja na seita do Divino Amor, na política adotada pelas ferramentas do futuro ou a governança, tudo está interligado, elas simplesmente são mostradas como normalidade. Todas concepções inteligentes e trabalhadas na trama demonstram um visão assustadora onde os direitos sexuais de todos que não são heterossexuais casados ​​tentando procriar estão em perigo e onde a maioria parece bastante relaxada em relação ao que suas crenças estão fazendo. O que fica evidente é que qualquer tipo de compaixão que tenha outras intenções além da empatia, não é compaixão mas uma forma de tirania. A utopia utilizada de maneira sucinta no filme é um dos maiores acertos de uma produção que tem grandes chances de ser uma fonte de frescor para o cinema nacional atual. DE CAIR O QUEIXO

O filme está em cartaz nos cinemas pela VITRINE FILMES.
Filme visto na Pré-estréia realizada em Brasília.

Hype: ÓTIMO

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